#FISL18: Conhecimento livre fortalece a produção cultural

Foto: Sheila Ubarte

Não é nenhuma novidade dizer que Isaac Asimov criou as três leis da robótica. São elas:

1ª Lei: Um robô não pode ferir um ser humano ou, por inação, permitir que um ser humano sofra algum mal.

2ª Lei: Um robô deve obedecer as ordens que lhe sejam dadas por seres humanos exceto nos casos em que tais ordens entrem em conflito com a Primeira Lei.

3ª Lei: Um robô deve proteger sua própria existência desde que tal proteção não entre em conflito com a Primeira ou Segunda Leis.

Agora, pare e pense: em quantos filmes, livros ou peças teatrais você já viu a exata aplicação dessas leis? Inúmeras obras são baseadas nesses princípios, mas em nenhum momento isso causou preocupação a Asimov – até onde se sabe, ele não processou George Lucas por imprimir essas características a R2-D2 e C3PO na saga Star Wars, por exemplo.

“Ele possivelmente ficou lisonjeado. E tudo isso fez com que ele fosse ainda mais conhecido. Quando o artista abre mão da sua própria obra, ele dá licença para que as pessoas criem em cima disso e ampliem esse trabalho”, defendeu Joel Grigolo na manhã desta quinta-feira (12) no Fórum Internacional Software Livre (FISL) 18.

Essa foi a mensagem central do cientista social, ativista do conhecimento livre e integrante do Hackerspace MateHackers, em Porto Alegre (RS), na palestra Cine Theatro Remix: O conhecimento livre na cultura uma analogia entre o SL.

Para ele, é necessário construir uma nova lógica sobre a produção cultural, reinventar conceitos, pois, atualmente, lutar pelo direito do autor significa, na prática, lutar pelas grandes distribuidoras – sempre bom lembrar que os criadores do Superman, Jerry Siegel e Joe Shuster, viram pouco da fortuna que a Time-Warner conquistou às custas do personagem.

“Na ciência, a gente acredita que deve publicizar os dados para que o experimento seja repetido e até mesmo negado. Então se existe essa oportunidade de liberar os dados para pessoa criar e desenvolver em cima da sua obra, por que não fazemos isso na cultura?”, questiona Grigolo, defendendo que os espaços em que o conhecimento flui livremente são muito mais criativos.

Ou seja, o conhecimento livre é um motor da criatividade artística e, portanto, pode ser visto como oportunidade por aqueles que produzem cultura.

“Queremos que o artista saiba que ele não está abrindo mão. O que eu digo é que para pequenos artistas como nós, a grande chance é liberar a obra e criar uma comunidade, distribuir de forma permissiva, para criar um biossistema em torno da criação. Todo mundo sabe que o Arduíno não seria nada sem sua comunidade, por exemplo”, afirmou.

Portanto, se é possível criar uma comunidade em torno do software livre, também é possível fazê-lo na cultura.

Acreditando que, em um hackerspace, é ainda mais importante fazer do que falar, Grigolo refletiu que não gostaria de apenas defender o conhecimento livre, mas de fazê-lo. Criou, então, o Cine Theatro Remix, regido pelo conceito de transformar uma obra já existente – e isso pode ser um sample musical, uma paródia ou o que fizer mais sentido para o criador.

Na primeira edição do projeto, a proposta foi repensar a obra do ator e diretor americano Buster Keaton. O grupo pegou dois roteiros do cineasta e adaptou, levando a história para Porto Alegre (RS).

“Fizemos legendas, como no cinema mudo, e deixamos contemporâneo. Trouxemos referências do jazz cigano, do choro, do samba, em uma atmosfera muito diferente da original. No espetáculo, também convidamos o público a se apropriar e se tornar autor da obra”, contou. Foram quatro apresentações na Associação Cultural Vila Flores, espaço que abriga o hackerspace.

Para a próxima edição, a ideia é pegar outra obra de domínio público, Metropolis, de Fritz Lang. A partir dela, Grigolo pretende discutir privacidade, novas relações de trabalho, comunidades e todas as reflexões que surgirem a partir do clássico.

 

Texto: Márcia Schuler